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Postado em 28.09.2011
Decisão suspende interdição do transporte de amianto em SP para comércio exterior ou interestadual. Uso de amianto continua proibido em território paulista. |
Os ministros do Supremo Tribunal Federal concederam liminar à Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística, autorizando o transporte de produtos, materiais ou artefatos que contenham crisotila, uma variação do amianto – elemento altamente tóxico e nocivo ao ser humano e ao meio ambiente – somente em estradas interestaduais e vias que levem a portos e aeroportos que estejam localizados no Estado de São Paulo. O uso de amianto continua proibido em território paulista.
A decisão foi tomada ao se analisar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 234) que questionava a Lei paulista 12.684/2007, proibidora da circulação, no Estado de São Paulo, de produtos e mercadorias à base de crisotila.
Na tarde de hoje (28), dois advogados do escritório Alino & Roberto – Cláudio Souza Neto e Mauro Menezes – ocuparam a tribuna para defender o fim do trânsito de amianto pelo estado de São Paulo, conforme delimita a lei questionada.
Cláudio de Souza Neto foi o primeiro a falar, em nome da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), na condição de amicus curiae. Ele enfatizou a importância da manutenção da lei paulista, que visa proteger o trabalhador que manuseia e transporta o amianto pelas estradas brasileiras, assim como previne a ocorrência de possíveis catástrofes resultantes de acidentes com veículos transportadores dessa substância ou de produtos derivados do amianto.
“A legislação federal, em matéria de proteção à saúde e ao meio ambiente, deve sempre ser tomada como piso. Cabe aos estados e municípios ampliar essa esfera protetiva”, afirmou Cláudio Neto.
Para sustentar igualmente esse ponto de vista, subiu à tribuna o advogado Mauro Menezes, que defendeu a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea), também na qualidade de amicus curiae. Ele lembrou que “em qualquer lugar do mundo, onde há amianto, há uma trilha de sofrimento, dor e morte a ele associado". Apontou como falácia o controle do amianto no Brasil: “Em um acidente em fevereiro de 2010, um caminhão derrubou 24 toneladas de amianto numa estrada federal do Estado do Rio de Janeiro. Qual o controle exercido sobre isso?, questionou.
Mauro Menezes destacou a importância de se concluir a discussão da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3937, ainda pendente de julgamento de mérito no STF, e que abrange toda a discussão sobre o uso, fabricação e circulação do amianto no Brasil. "A lei estadual questionada por meio da ADPF não ofende a Constituição Federal. Antes a cumpre, a consagra, nos seus princípios mais avançados, no respeito à saúde, à dignidade da pessoa humana", reforçou o advogado. Ele citou estudos que apontam que não existem limites seguros de contato com o amianto, e revelou que mais de 50 países já decretaram o banimento total do amianto, em todas as suas formas geológicas.
Voto
O relator do processo, ministro Marco Aurélio, concedeu parcialmente a liminar, no que foi seguido por seus colegas, à exceção dos ministros Ayres Britto, Celso de Mello e Cezar Peluso (6 votos a 3). O relator entendeu que cabe à União legislar sobre transporte interestadual, não podendo o Estado de São Paulo limitar a circulação de produtos derivados de amianto. Portanto, deve ser mantido o transporte nacional e internacional desse tipo de mercadoria.
Marco Aurélio apenas ressalvou que a Corte ainda não se pronunciou definitivamente sobre a Lei nº 9.055/1995, que disciplina, no âmbito federal, a proteção da sociedade contra os efeitos do amianto, e que teve a constitucionalidade questionada no STF (ADI 3937). Dessa forma, conforme seja a decisão da Corte, esta pode afetar diretamente o julgamento da ADPF 234.
Ayres Britto abriu dissidência ao defender que a lei paulista é mais abrangente em seu teor que a própria legislação federal, ao resguardar os princípios constitucionais do direito à vida, à saúde humana e ao meio ambiente, a partir do momento que proíbe a circulação de mercadorias à base de amianto no âmbito do estado de São Paulo.
Com ele concordou o ministro Celso de Mello, que salientou que a lei federal é menos fiel ao mandamento constitucional e, por sua vez, à lei paulista em questão.
O decano destacou que outros estados-membros, como o Rio Grande do Sul, já proíbem a circulação, em seu território, de produtos provenientes do amianto. “O que me parece é que os países desenvolvidos estão tratando de remeter aos países periféricos o uso desse produto (amianto). Rússia e China permitem o uso de amianto em seus territórios”, afirma Celso de Mello, que acredita ser isso uma violação aos direitos humanos, principalmente ao direito à vida, dada a alta taxa de letalidade dos expostos ao amianto.
O presidente do STF, ministro Cezar Peluso, também seguiu a divergência, ponderando que é totalmente legítimo que o estado defenda o seu território de um elemento químico tóxico e letal como é o amianto. “Não vejo porquê o estado de São Paulo não possa legislar sobre proibição de circulação de cargas tóxicas e letais como o amianto só porque a legislação federal é mais branda", declarou.
Caso
Segundo a Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística – ingressou com Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 234) no STF contra a lei paulista – embora haja lei federal que proíbe, em todo o território nacional, a extração e utilização das variedades minerais pertencentes ao grupo dos anfibólios (entre eles o asbesto marrom e o amianto azul) e libera tais atividades em relação ao amianto branco, a lei paulista ampliou a proibição contida na lei federal alcançando este último e está resultando na proibição do transporte da carga pelas rodovias do estado.
Não há data prevista para o julgamento do mérito da ação pelo Plenário do STF. No julgamento de hoje (28), o quórum estava incompleto, vista a ausência do ministro Joaquim Barbosa, em licença-médica, e a vacância da cadeira da ministra Ellen Gracie, que se aposentou em agosto.
Assista às sustentações orais dos advogados Cláudio de Souza Neto e Mauro Menezes. Leia a íntegra do voto do relator, ministro Marco Aurélio. Assista à leitura do voto do relator e votos dos ministros. Assista ao vídeo com os votos dos ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso.
Texto: Andréa Mesquita/Assessoria de Imprensa A&R